EXCELENTE ARTIGO DE UM JORNALISTA, FILHO DE UM JUIZ, SOBRE A ATUAL SITUAÇÃO DA JUSTIÇA NO BRASIL
12:37CarlOS - Sam
JADER BARBALHO “FICHA SUJA” DE VOLTA AO SENADO.
ENQUANTO ISSO NA JUSTIÇA, TUDO CAMINHA DE MAL A PIOR.
É com satisfação que reproduzo este artigo de J.R.
Guzzo sobre nosso pobre Judiciário, publicado na edição de VEJA que está nas
bancas.Antes que o acusem de preconceito contra a classe, esclareço que Guzzo –
diretor de Redação da revista por 16 anos e hoje no comando do grupo Exame, da
Editora Abril – é filho de um juiz de Direito que, diferentemente dos que
critica abaixo, honrou a toga.
Aparecendo demais.
J. R. Guzzo
É pouco provável que
exista no mundo algum outro país em que juízes, desembargadores, ministros de
tribunais superiores e integrantes do Poder Judiciário em geral apareçam
tanto na imprensa como acontece hoje no Brasil.
Bom sinal com certeza
não é, sobretudo quando se considera o tipo de noticiário em que costumam
aparecer. Ora é porque estão em greve, ou ameaçando entrar em greve, por aumento
de salário.
Ora é porque
estão processando o governo, em ações que serão julgadas por colegas nas
instâncias acima deles, para receber equiparações, compensações e outros
benefícios em dinheiro.
Vivem, através das suas
associações de classe, publicando manifestos a favor de si próprios. Vão a
resorts de luxo, com despesas pagas por gente de quem deveriam estar longe, e
ficam revoltados quando a imprensa publica informações sobre isso. Com
frequência inquietante, e pelo país inteiro, saem notícias sobre magistrados
investigados ou processados por ofensas ao Código Penal.
Episódios de conduta
incompatível com a função judicial tornam-se cada vez mais comuns.
Nepotismo, pagamentos
ilegais, promiscuidade
Não causaram nenhuma
estranheza, por exemplo, as informações, reforçadas por fotos, que a Folha
de S.Paulo publicou há pouco sobre a campanha feita pelo
presidente do Superior Tribunal de Justiça, Ari Pargendler, em favor de sua
cunhada Suzana Camargo, candidata a uma vaga na corte presidida por ele.
O mesmo aconteceu com a
notícia, divulgada no começo de dezembro, revelando que dezessete
desembargadores do Tribunal de Justiça de São Paulo estão sendo investigados
pela Corregedoria do Conselho Nacional de Justiça sob a acusação de receber
pagamentos ilegais; há investigações, também, sobre magistrados paulistas
suspeitos de ter patrimônio incompatível com a sua renda.
Brasília, então, é um
capítulo à parte. Como descreveu recentemente uma reportagem de VEJA, juízes
das mais altas instâncias do país vivem em estado de aberta promiscuidade com
advogados dos grandes escritórios do Rio de Janeiro, de São Paulo e de lá
mesmo, políticos envolvidos em processos de corrupção e grandes empresários
enrolados com a Justiça — para não falar de réus com processos em andamento.
Cruzam-se em festas de
aniversário, casamentos, feijoadas, torneios de golfe.
Em vez de esconderem,
advogados exibem em público sua amizade com magistrados, deixando correr a
impressão de que podem ganhar qualquer causa; seus honorários não sofrem
nada com isso.
Eliana Calmon e Cezar
Peluso: cada um escolhe suas batalhas
Todo esse caldo vem
sendo consideravelmente engrossado, de uns tempos para cá, pela ministra Eliana
Calmon, do Superior Tribunal de Justiça e atual titular da Corregedoria
Nacional de Justiça.
Essa ministra tem um
problema sério: acredita que deve cumprir, realmente, suas obrigações de
corregedora, segundo determina a lei. Solicita investigações. Ouve denúncias.
Tenta apurar delitos, violações éticas e outras malfeitorias atribuídas a
autoridades judiciárias.
É apenas o seu dever —
mas por fazer o que manda a lei a ministra Eliana está com índices de
popularidade próximos a zero entre os seus colegas.
Ministra que fala o que
pensa
Em nada a ajudam, é
claro, sua inclinação a falar exatamente o que pensa e sua pouca paciência para
adoçar o que fala. Recentemente, por exemplo, disse que o Judiciário sofre de
“gravíssimos problemas” causados pela “infiltração de bandidos escondidos atrás
da toga”, referindo-se ao fato notório de que a todo momento, e em todo o
Brasil, vêm a público denúncias de corrupção entre juízes, desembargadores
ou ministros dos tribunais superiores.
O presidente do Supremo
Tribunal Federal, Cezar Peluso, declarou-se “indignado” — não com os
bandidos, mas com Eliana. Disse que suas palavras eram uma “ameaça à
democracia”, e assegurou que em quarenta anos de carreira nunca tinha visto
“coisa tão grave”.
Suas escolhas lhe custaram a
vida - sem apoio do STF nem antes nem depois da morte (Frederico
Rozario/Agência O Globo)
Solidariedade à
categoria vem antes dos deveres de juiz.
O ministro poderia ter
dito que em seus quarenta anos de carreira a situação do Judiciário
brasileiro nunca foi tão calamitosa como hoje — e que, no caso, o que realmente
ameaça a democracia é a impunidade para juízes criminosos.
Mas é claro que não
disse. Como acontece com tantos outros magistrados hoje em dia, ele
acredita que seus deveres de solidariedade com a categoria vêm antes de seus
deveres como juiz. É uma pena que esse apoio não se estenda aos milhares de
juízes honestos que existem no Brasil — e que podem perder a vida por causa de
sua integridade, como ocorreu com a juíza fluminense Patricia Acioli,
assassinada com 21 tiros em agosto último por aplicar a lei contra o crime
organizado.
Nenhum ministro do STF
se deu ao incômodo de comparecer ao
seu enterro.
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