GUAJÁS:UMA TRIBO DE APENAS 350 ÍNDIOS SENDO EXTERMINADA E O GOVERNO FEDERAL NÃO FAZ NADA PARA EVITAR.
15:34Brasília, Brasil e o mundo sem retoques!
GETHIN CHAMBERLAIN
DO "OBSERVER"
DO "OBSERVER"
Índia da tribo Guajá amamenta porco do mato.
Esta foto recebeu o Prêmio de Jornalismo Rei da Espanha em 1993
Desde o ano passado, esta denúncia corre o
mundo inteiro até mesmo com apoio e
intervenção de artista de cinema famosos que
tentam evitar um verdadeiro genocídio.
E o Governo Federal do Brasil, nada faz!
Percorrendo as estradas de terra da Amazônia, o grande
caminhão madeireiro apequenava o veículo dos investigadores que o seguia. Na
caçamba, troncos de árvores gigantescas formavam uma pilha alta --prova
inegável da destruição continuada da maior floresta tropical do planeta e da
tribo indígena que enfrenta os mais graves riscos, os guajás.
Mas ao percorrer a selva no começo do ano, a pequena equipe
da Fundação Nacional do Índio (Funai) brasileira não ousou tentar deter os
madeireiros; seu veículo era grande demais, e os ocupantes quase certamente
estavam armados. Tudo que puderam fazer foi filmar o caminhão e acrescentar o
vídeo às provas cada vez mais volumosas que mostram de que modo os guajás --uma
tribo com apenas 355 sobreviventes, mais de cem dos quais sem qualquer contato
com o mundo externo-- oscilam à beira da extinção.
É uma cena que se repete em toda a Amazônia, enquanto as
autoridades se esforçam para impor controle à poderosa indústria madeireira
ilegal. Mas não é apenas a perda de árvores que criou uma situação séria a
ponto de o juiz brasileiro José Carlos do Vale Madeira descrevê-la como
"verdadeiro genocídio".
Pisco del Gaiso-10.jun.1995/Folhapress
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As terras dos guajás não param de ser invadidas, para a
construção de assentamentos ilegais e criação de fazendas de pecuária. Há
acusações de que pistoleiros mercenários estão caçando os guajás que tentam
impedir a invasão de suas terras. Membros da tribo descrevem a execução de
famílias inteiras. Ativistas dos direitos humanos dizem que a tribo chegou a um
momento decisivo, e que apenas ação imediata do governo brasileiro para impedir
a exploração madeireira pode salvá-la.
Esta semana, a Survival International lançará uma nova
campanha para revelar a situação dos guajás, com apoio do ator Colin Firth, 51.
Em vídeo que será lançado quarta-feira (25), Firth, ganhador do Oscar, apelará
ao governo brasileiro por ação urgente de proteção à tribo.
O ator, astro do filme "O Discurso do Rei", grande
sucesso em 2011, ganhou fama interpretando Mr. Darcy em uma adaptação de
"Orgulho e Preconceito" produzida em 1995 pela BBC, e apela
diretamente ao ministro da Justiça brasileiro, no vídeo, pelo envio de
policiais para expulsar os madeireiros.
Os guajás são uma das duas únicas tribos de
caçadores-coletores nômades que restam na Amazônia. De acordo com a Survival
International, se tornaram a tribo em mais alto risco no planeta, sob ataque de
madeireiros, pistoleiros e colonos agrícolas hostis.
Os
problemas da tribo começaram a se agravar em 1982, com a estreia de um programa
da Comunidade Econômica Europeia (CEE) e do Banco Mundial para a exploração dos
ricos depósitos de minério de ferro na serra de Carajás. A CEE deu US$ 600
milhões ao Brasil para a construção de uma ferrovia ligando as minas à costa,
sob a condição de que um terço da produção mínima de 13,6 milhões de toneladas
anuais fosse destinado à Europa, por 15 anos.
A ferrovia atravessava diretamente as terras dos guajás, e
com ela vieram colonos. Um programa de construção de rodovias não demorou a
surgir, abrindo o lar florestal dos guajás aos madeireiros, que chegavam do
leste.
De acordo com Fiona Watson, diretora de pesquisa da Survival
International, essa foi a receita para um desastre. Um terço do território dos
guajás nas selvas do Maranhão, nordeste do Brasil, foi destruído, desde então,
e forasteiros expuseram a tribo a doenças contra as quais ela não tem imunidade
natural.
"Os guajás e a porção não contatada da tribo estão
realmente à beira da extinção", ela diz. "A população é extremamente
pequena e as forças que se alinham contra eles são imensas. Estão sendo
invadidos por madeireiros, colonos e pecuaristas. Dependem totalmente da
floresta, e me disseram que se não tiverem floresta não serão capazes de
alimentar suas crianças, e que elas morrerão".
DESTRUIÇÃO E VIOLÊNCIA
Mas ao que parece os guajás enfrentam ameaça mais direta. No
começo deste ano, uma investigação sobre denúncias de que uma criança guajá
teria sido morta por madeireiros constatou que um acampamento da tribo havia
sido destruído por tratores.
"Não é apenas a destruição da terra, mas também a
violência", diz Watson. "Conversei com guajás que sobreviveram a
massacres. Entrevistei guajás cujas famílias foram fuziladas diante deles. Há
pessoas imensamente poderosas que agem contra eles. Os posseiros utilizam pistoleiros
para limpar as áreas que desejam ocupar. Se isso não for detido agora, esse
povo pode ser exterminado. É uma extinção, ocorrendo bem diante de nossos
olhos".
O mais notável sobre o vídeo registrado pela equipe de
investigação sigilosa da Funai, além do imenso tamanho dos troncos, é a
ausência de selva nos locais de filmagem. No passado, uma floresta tropical
luxuriante ocupava a região. Agora, todas as árvores foram removidas, deixando
apenas grama e mataria baixa, e apenas alguns tocos de árvores dispersos.
A afinidade dos guajás pela floresta e seus habitantes é
tamanha que, se encontram um animal bebê em suas caçadas, levam-no com eles e o
criam quase como a um filho; há casos em que a criatura é amamentada por
mulheres da tribo. A perda de sua selva os levou ao desespero. "Estão
derrubando as árvores e vão destruir tudo", disse Pire'i Ma'a, membro da
tribo. "Macacos, pecaris, tatus, todos estão fugindo. Não sei como vamos
comer --tudo está sendo destruído, a área toda".
"Essa terra é minha, é nossa. Eles podem voltar à
cidade, mas nós índios vivemos na floresta. Vão matar tudo. Tudo está morrendo.
Vamos todos passar fome, as crianças passarão fome, minha filha passará fome, e
eu passarei fome também", afirmou.
Em entrevista anterior à Survival International, outro membro
da tribo, Karapiru, descreveu a morte da maioria dos membros de sua família,
vítimas de agricultores invasores. "Eu me escondi dos brancos na floresta.
Mataram minha mãe, meus irmãos e irmãs e minha mulher", ele contou.
"Levei um tiro durante o massacre e sofri muita dor, porque não conseguia
aplicar remédio em minhas costas. Não via a ferida. Foi sorte eu ter escapado
-foi obra de Tupã. Passei muito tempo na floresta, faminto e perseguido pelos
agricultores. Estava sempre correndo, sozinho. Não tinha família que me
ajudasse, com quem conversar. Por isso penetrei cada vez mais na
floresta".
"Espero que minha filha cresça sem enfrentar as
dificuldades que eu tive. Espero que tudo seja melhor para ela. Espero que as
coisas que me aconteceram não aconteçam a ela", acrescentou.
A campanha da Survival International reflete a crescente
preocupação internacional quanto aos problemas das tribos indígenas que ainda
restam no planeta. Alguns meses atrás, o "Observer" revelou que a
polícia estava conspirando com agentes de turismo nas ilhas Andaman, parte da
Índia, para a realização de safáris humanos no coração do território silvícola
dos jarawa, uma tribo protegida. Um vídeo mostrando mulheres e meninas jarawa
seminuas dançando em troca de comida causou indignação na Índia e em todo o
mundo. Surgiram outras revelações, expondo safáris humanos no Estado indiano de
Orissa e no Peru, onde agências de viagem estavam explorando tribos indígenas
da Amazônia.
E traficantes de drogas representam ainda outra ameaça às
tribos amazônicas. No ano passado, uma tribo que até então vivia sem contato
foi fotografada do ar perto da fronteira entre o Peru e o Brasil mas
desapareceu de novo meses mais tarde, quando uma quadrilha de traficantes de
drogas derrotou os seguranças que protegiam seu território.
OUTRO LADO
A Embaixada do Brasil em Londres informou que questões quanto
a essa situação deveriam ser encaminhadas ao secretariado de direitos humanos
da Presidência da República, que não respondeu. Mas o Brasil pode se defender
mencionando pesquisas recentes que demonstram progresso no combate à exploração
madeireira ilegal. O Instituto Nacional de Pesquisa Espacial brasileiro estima
que 6.238 km² de floresta tropical tenham sido perdidos entre 2010 e 2011, uma
queda dramática ante o pico de 27,7 mil quilômetros quadrados de 2004. Naquele
ano, o Brasil prometeu reduzir seu desflorestamento em 80% até 2020.
A queda na área desmatada foi de 11% no ano passado, e em
2011 o departamento florestal brasileiro realizou uma operação de busca que
resultou no fechamento de 14 serrarias ilegais nos limites do território guajá.
Mesmo assim, as estatísticas também demonstram que dois Estados registraram
alta acentuada no desmatamento e que a exploração madeireira ilegal está
destruindo a selva dos guajás em ritmo mais acelerado do que o verificado para
qualquer outra tribo amazônica.
A Survival International divulgou declaração na qual insta o
governo brasileiro a ampliar seu apoio à Funai e seus esforços para reprimir as
atividades ilegais no território dos guajás. "A questão é premente, e o
momento agora, porque embora nem toda esperança esteja perdida, todo um povo
está à beira de se perder, especialmente os guajás não contatados. Temos a
responsabilidade moral de agir. Dinheiro da União Europeia e do Banco Mundial
ajudou a financiar grandes projetos que exploraram os recursos da terra dos
guajás, no Brasil, e criaram infraestrutura que permite exploração".
A campanha da Survival International está no site www.survivalinternational.org.
Tradução de PAULO MIGLIACCI.
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