Para 9 entre 10 torcedores, Copa deixará imagem negativa,
08:37Brasília, Brasil e o mundo sem retoques!
Na reedição de uma pesquisa realizada por VEJA em 2011,
percepções sobre a organização do Mundial no Brasil ficam ainda piores. E isso
é ruim para todos...
Se os resultados da sondagem de três anos atrás já eram
ruins, o quadro que se desenha na nova pesquisa é extremamente preocupante para
o governo e a Fifa. A visão dos entrevistados sobre a organização do
Mundial piorou em absolutamente todas as perguntas repetidas do levantamento
anterior
Desde que entrou no Comitê Organizador Local (COL) da Copa do
Mundo, há pouco mais de dois anos, o ex-craque Ronaldo foi um pregador incansável
do otimismo em relação ao evento — gravou campanha do governo federal, promoveu
o torneio no exterior e até apareceu numa célebre propaganda da
Brahma, vestido como um Tio Sam verde e amarelo, num cartaz que provocava
quem duvida do sucesso do Mundial. Na última terça, porém, Ronaldo
mudou de tom e lamentou publicamente o aperto para concluir os
estádios a tempo. "Acho uma pena. É o nome do nosso país lá
fora. Não é bom passar essa imagem para o mundo", disse, num evento da
própria Brahma no Maracanã, o palco da final da Copa. Escalado pela presidente
Dilma Rousseff para ser o homem forte do governo no Mundial, o ministro Aldo
Rebelo é outro que se abateu com os problemas desta reta final. Se antes
zombava das preocupações com os prazos (chegou a dizer, no Senado, que
os atrasos eram só "impressão" da população), o ministro
agora se mostra alarmado com enroscos como o de Curitiba, que
escapou de ser cortada pela Fifa na última terça.
"Devemos confiar
desconfiando. É preciso trabalhar duro", alertou. Até Jérôme Valcke, o
irritadiço francês que serviu de xerifão da Fifa nos preparativos para o
evento, tentou levantar a bola do Brasil num passado recente. "É
muito difícil entender por que, em um país que vive e respira futebol, algumas
poucas pessoas continuam a enxergar apenas aspectos negativos, mesmo que não
haja nada de negativo", escreveu, há um ano, num texto divulgado no
site da Fifa. Ao anunciar a manutenção de Curitiba entre as doze sedes, na
semana passada, num seminário em Florianópolis, Valcke era a personificação do
mau humor, destilando azedume a cada declaração sobre os compromissos assumidos
— e descumpridos — pelos brasileiros.
Os sinais de apreensão revelados por Ronaldo, Aldo
Rebelo e Valcke, as personalidades mais emblemáticas da contagem regressiva
para a Copa no Brasil, se refletem também na opinião pública. Faltando
menos de quatro meses para a abertura, o retorno da grande festa do
futebol ao país, mais de seis décadas depois do primeiro Mundial realizado
por aqui, desperta sentimentos ruins no torcedor. Para mensurar esse clima
de pessimismo, o site de VEJA reeditou uma pesquisa feita originalmente em
julho de 2011, convidando os leitores a opinar outra vez sobre a
Copa e o país-sede.
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Será que o brasileiro está perdendo a paixão pela suia seleção?
O novo levantamento, realizado pelo Departamento de Pesquisa e Inteligência de Mercado da Editora Abril, registrou as impressões de 4.381 pessoas de todas as regiões brasileiras, que responderam a quinze questões ligadas ao evento entre os dias 17 e 19 de fevereiro. Se os resultados da sondagem de três anos atrás já eram ruins, o quadro que se desenha na nova pesquisa é extremamente preocupante para o governo e a Fifa. A visão dos entrevistados sobre a organização do Mundial piorou em todas as perguntas repetidas do levantamento anterior. Em 2011, 79% diziam que o país deixará uma imagem negativa na Copa; agora, nove em dez acham que o saldo será ruim para o país. Se antes 88% achavam que nem todas as obras ficarão prontas a tempo, agora 94% têm essa convicção. E se 32% pensavam que o evento deixará coisas boas ao país (excluindo-se os estádios), hoje esse contingente é de apenas 13%. Questionados sobre o que sentem quando pensam na Copa do Mundo, os entrevistados trocaram a "preocupação", resposta mais citada em 2011, com 58%, pela "vergonha", com 55%. No total, 87% afirmam que não estão satisfeitos com a realização do torneio no país (antes eram 73%) e 85% garantem que não estão ansiosos pelo início do evento (há três anos eram 75%).
Nas duas questões, os porcentuais foram iguais. Em 2011,
pessimismo era menor: 79% achavam que a Copa deixaria uma imagem negativa e
78%, que os estrangeiros teriam má impressão.
Vitrine do governo - A percepção negativa do
brasileiro em relação à Copa é ruim para todo mundo: para as sedes, que podem
ficar sem o retorno financeiro sonhado quando conquistaram um lugar no evento;
para a organização, que enfrentará um contexto desfavorável na hora de
realizar o torneio; para a Fifa, que se arrisca a comprometer o sucesso de seu
produto mais rentável; e para os patrocinadores, que gastaram fortunas para
atrelar suas marcas a um Mundial cercado de dúvidas e críticas. Mas ninguém tem
mais motivos para se preocupar do que os governos, Estados e municípios, que
bancaram nada menos de 93,7% dos 8,9 bilhões de reais gastos até agora nos
estádios (a previsão inicial era de 2,6 bilhões). Curiosamente, é quase o
mesmo porcentual de pessoas que se dizem contra o uso de dinheiro público na
construção e reforma das arenas (94%, contra 85% em 2011). Outro dado é
especialmente preocupante para quem apostou tão alto — e torrou tanto dinheiro
— nas obras da Copa. Questionados sobre quem será o culpado caso o Mundial seja
uma decepção, 94% dos entrevistados apontaram o governo federal, contra apenas
12% que citam a Fifa. Há três anos, o governo era visto como principal
responsável pelo evento por 79% das pessoas. A ligação cada vez maior entre a
imagem da Copa e o governo, diga-se, é mais do que compreensível.
Na tentativa
de propagandear a Copa como catalisador do desenvolvimento, principalmente na
área de infraestrutura, o
Planalto ampliou sua interferência na condução dos preparativos para
o evento. Em ano eleitoral, a expectativa era de que a festa serviria de
vitrine para projetos de mobilidade urbana e modernização dos aeroportos. O
ritmo capenga desses projetos e o cancelamento de alguns deles
esvaziaram o argumento oficial em defesa dos gastos com o evento.
Reprodução
Não haverá revolução na infraestrutura em função da Copa. Os
avanços modestos — em alguns casos, na base do "puxadinho"
— dificilmente serão o bastante para convencer a população, que se vê,
mais uma vez, diante da concretização de suas piores expectativas sobre o
país e seus governantes. Quando a Fifa confirmou que o Brasil receberia o
torneio, em 2007, o brasileiro não comemorou: ele desconfiava que as obras
acabariam custando muito mais que o prometido, estourariam todos os prazos,
teriam falhas de planejamento e seriam bancadas pelo dinheiro do contribuinte,
com participação quase inexistente da iniciativa privada. Dito e feito: sete
anos depois, os clichês mais surrados sobre um país que custa a abandonar seus
vícios se confirmam, um a um.
O quadro torna-se ainda mais delicado diante de um advento
preocupante para o Planalto. Desde as manifestações de junho de 2013,
realizadas simultaneamente à Copa das Confederações, a cobrança em relação aos
gastos excessivos no Mundial ganhou tons muito mais agressivos e estridentes. A
mobilização via internet que promete que "não vai ter Copa" ganhou
fôlego (ainda que seja ilusória: vai ter Copa, sim, mesmo
que com o Exército ao redor dos estádios, como prometeu Dilma há alguns
dias). Os protestos e a truculência dos black blocs foram o assunto da única
questão adicionada ao questionário elaborado em 2011 na pesquisa do site
de VEJA — na ocasião, ninguém imaginava que haveria risco de vandalismo em
torno das arenas do Mundial. Consultados sobre o que deve acontecer no
evento, os leitores que participaram da nova sondagem apostaram em protestos
capazes de furar bloqueios policiais e chegar aos arredores dos palcos das
partidas, causando dores de cabeça aos organizadores. Esse é o cenário previsto
por 43% dos entrevistados.
Outros 22% participantes da pesquisa acham que os
manifestantes não serão capazes de atrapalhar o torneio, enquanto 22% temem uma
situação extrema, em que os protestos ganhariam tamanho impulso que a Fifa
teria de recorrer a medidas drásticas, como adiar partidas por falta de
segurança. Só 13% acham que a onda de manifestações vai perder força no
Mundial. Na virada do ano, a imagem da Copa do Mundo e o risco de uma
repetição das cenas de junho foram discutidos em diversas reuniões estratégicas
do Planalto. Dilma ordenou uma ofensiva de marketing e comunicação para
tentar promover aspectos positivos do evento – afinal, a
presidente sabe que uma Copa realizada sob um contexto negativo poderá ter
impacto sobre sua tentativa de reeleição. No início do mês, o governo decidiu
ajustar o discurso. Com base em uma pesquisa de opinião encomendada para
avaliar as manifestações do ano passado, Dilma colocou em segundo plano a
defesa dos investimentos em obras da Copa e passou a apelar para o ufanismo do
país do futebol. Saiu o "legado", entrou a "Copa das
Copas", slogan adotado por Dilma nas inaugurações de estádios (e
emprestado até por Joseph Blatter e Jérôme Valcke em alguns pronunciamentos).
De acordo com reportagem do jornal Folha de S. Paulo, trata-se de
uma criação do marqueteiro Nizan Guanaes, surgida numa reunião sigilosa
com a presidente. Nizan,
aliás, é um dos responsáveis pela campanha "Imagina a festa",
da Brahma, a mesma que retratava Ronaldo como um Tio Sam tupiniquim, num
cartaz que estampa uma mensagem com tom de
intimidação: "Pessimistas, pensem bem". Mas eles são a
maioria. E a propaganda lançada em 2012, que mostrava uma população
eufórica celebrando nas ruas a glória nacional, hoje parece mais
fantasiosa do que nunca.
Estádios privados:
O ministro do Esporte do governo Lula prometia uma Copa
totalmente privada, sem uso de dinheiro público nas arenas. Entre as doze sedes
do Mundial, porém, só três (São Paulo, Curitiba e Porto Alegre) são
empreendimentos particulares - e mesmo essas obras dependem de financiamento de
bancos estatais e generosos incentivos públicos.
COM INFORMAÇÕES DE:
http://veja.abril.com.br/
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