A NOVA FACE DAS ENERGIAS RENOVÁVEIS QUE PODEM MUDAR O MUNDO.
15:53Brasília, Brasil e o mundo sem retoques!
"As
energias renováveis despertam interesse econômico em segurar as mudanças
climáticas.
"O economista francês Christian Stoffaës fala sobre as negociações
para a COP-21, a ser realizada em Paris neste ano, e a importância das fontes
sustentáveis para o comprometimento global de reduzir as emissões de gases de
efeito estufa."

Para o francês Christian Stoffaës, membro do Ministério de
Economia da França e professor de economia internacional na Universidade de
Paris, o desenvolvimento da indústria de energia renovável e o consequente
barateamento dos recursos sustentáveis serão pontos essenciais para que os
países cumpram as metas de diminuição de emissões de gases de efeito estufa a
serem estabelecidas na Cúpula do Clima de Paris, que acontece em dezembro deste
ano. A expectativa é que, no fim da conferência, os 195 países da ONU assinem
um acordo que vai substituir o defasado Procotolo de Quioto, de 1997, até hoje
base para a implementação de leis sustentáveis. Stoffaës falou a VEJA em visita
ao Brasil na semana passada, durante um círculo de palestras na FGV do Rio de
Janeiro.
Na última Cúpula do Clima, que aconteceu em Lima, no Peru, no
fim do ano passado, surgiram críticas que apontaram a lentidão das negociações
entre governos. O que podemos esperar de Paris? Até dezembro, os diplomatas
continuarão negociando para encontrar um consenso mínimo sobre o acordo. Nos
últimos quinze anos (que seguiram o Protocolo de Quioto) esse processo foi prejudicado
pelo fato de os Estados Unidos não terem ratificado o documento e por países
participantes, como o Canadá e a Austrália, terem desistido de suas metas no
meio do caminho. É importante lembrar que nessa COP as vozes a serem ouvidas
não são só a dos diplomatas, mas também a de representantes da sociedade civil,
da indústria e de ONGs. A expectativa é que haja 45 000 pessoas em Paris, e só
o fato de tanta gente se encontrar para debater essas questões já é algo
importante. Gera mais pressão para que se apresente um resultado satisfatório,
o que certamente irá acontecer, mas nós ainda não sabemos como esse documento
será. Se as conversas relativas a corte de emissões não evoluírem, é importante
achar outras vias de negociação.
Quais seriam essas outras vias? Acho que um bom exemplo é a
COP-15, que aconteceu em Copenhague em 2009. No evento, a posição defensiva dos
Estados Unidos impediu qualquer possibilidade de avanço nas negociações de
redução de emissões, então foi preciso encontrar outra forma de ajudar os
países em desenvolvimento a lidar com as mudanças climáticas. O resultado foi a
criação do Fundo Verde do Clima, que é basicamente o comprometimento dos países
desenvolvidos em transferir 100 bilhões de dólares por ano às nações em
desenvolvimento, mais vulneráveis economicamente, para lidar com as mudanças
climáticas. Mesmo hoje, um dos focos da negociação ainda é esse, porque 100
bilhões de dólares não é uma quantia fácil de encontrar. Alguns países já se
comprometeram, mas ainda é difícil. A negociação para um novo Protocolo de
Quioto não será fácil, mas temos que construir esse consenso.
Quais serão os maiores obstáculos para se chegar ao consenso?
Existe uma coalizão entre os países desenvolvidos e, do lado oposto, outra
entre as nações em desenvolvimento. O Protocolo de Quioto estabeleceu que
apenas os primeiros deveriam se comprometer com reduções absolutas de emissões.
A posição dos países desenvolvidos é de que a concentração de dióxido de
carbono na atmosfera não é de responsabilidade exclusiva deles e que, portanto,
eles não merecem ser prejudicados, por também terem direito a investirem no
próprio desenvolvimento, o que pode ocasionar no aumento das emissões de CO2. É
um argumento forte, mas se quisermos um acordo, é preciso que os países se comprometam.
De qualquer forma, apesar desses acordos exigirem que os países estabeleçam
metas, não há nenhuma penalidade caso eles não as cumpram. Em resumo, o grande
obstáculo a ser superado é o da conciliação entre o grupo dos desenvolvidos com
o dos em desenvolvimento.
Esse é um embate presente nas conferências há algum tempo, e
a impressão que ficou de Lima é que nenhum dos dois lados está disposto a
ceder. Há solução? Esse é o trabalho dos diplomatas. As negociações são
sigilosas, eu não sei exatamente o que está acontecendo, mas tenho certeza que
estão trabalhando duro nisso. Quanto ao embate entre os dois lados, o papel das
Nações Unidas é defender a unanimidade, ou seja, um acordo só passa se for
aprovado por todos. Se a regra fosse da maioria, seria mais simples: os países
em desenvolvimento, que representam cerca de dois terços do total da ONU,
seriam beneficiados; mas isso negaria todo o processo diplomático da ONU.
Há risco de que, depois de tanta negociação, o acordo de
Paris caia na irrelevância ao não ser ratificado pelos países mais poluidores,
como aconteceu com Quioto? Eu estava presente na COP-97, onde foi assinado o
Protocolo. Al Gore veio à conferência com um mandato do presidente Bill
Clinton. O vice-presidente assinou o documento, mas quando voltou para os EUA o
senado o bloqueou. Poucas pessoas sabem disso, mas naquela época o senado
americano votou uma resolução chamada Byrd-Hagel, que diz que os EUA nunca vão
assinar um acordo de políticas climáticas em que não haja um comprometimentos
dos países em desenvolvimento equivalentes àqueles assumidos pelos
desenvolvidos. Essa questão ainda não foi resolvida, porém, é preciso ser
otimista. Temos que lembrar que muita coisa mudou desde 1997. O maior exemplo
talvez seja o surgimento da indústria de energia renovável, que teve um
desenvolvimento espetacular nos últimos dez anos, em consequência das
negociações climáticas.
É certo deduzir que as energias renováveis só se
popularizarão quando forem mais vantajosas economicamente do que as fontes fósseis?
Sim, mas hoje as renováveis não estão tão longe da competitividade econômica. É
impressionante ver como o preço dos painéis solares caiu muito em pouco tempo,
e isso é mais um resultado das negociações climáticas. Acordos como o de China
e EUA (que se comprometeram a cortar significativamente as emissões de CO2 até
2030) só foram firmados porque hoje existem fontes alternativas viáveis, que
permitem que os países assumam compromissos mais ambiciosos. Além disso, é
preciso lembrar que o petróleo e o gás são finitos. A indústria finalmente
percebeu a necessidade de encontrar substitutos para eles, e agora a competição
está entre as renováveis e a energia nuclear.
O preço baixo do petróleo pode prejudicar a popularização das
renováveis ou mesmo as negociações climáticas? O preço do petróleo tem muita
influência, claro. Nos últimos meses, o preço caiu espetacularmente, pela
metade. Nós veremos os efeitos disso em Paris, e ainda não há como prever com
precisão os resultados. Mas é importante ressaltar que o consumo de carvão
também aumentou na última década, apesar das negociações. E como o carvão ainda
é a fonte de energia mais barata, geralmente é a melhor solução para os países
em desenvolvimento que têm dificuldade em responder à demanda energética interna
sem ter de apelar aos poluentes.
Se a energia renovável se tornar mais econômica, podemos
admitir que mais pessoas optarão por elas. Mas isso não faria com que o preço
dos combustíveis fósseis também caíssem, como efeito da lei de oferta e
procura? Uma das opções é o uso de subsídios. A expansão das renováveis nas
últimas duas décadas foi intensamente subsidiada, especialmente pela Tarifa
Prêmio (Feed-in, em inglês), um mecanismo de promoção eficiente. Essa tarifa,
desenvolvida pela Alemanha, estabelece que produtores de energia renovável
possam vender a energia produzida para agências elétricas por um preço fixo, o
que é vantajoso. Outra estratégia seria a taxação global dos combustíveis
fósseis. As negociações devem avançar nesse sentido também.
Você citou o acordo bilateral entre China e Estados Unidos,
apresentado em setembro do ano passado. Será que esses acordos menores não são
mais eficientes em fazer com que países estabeleçam metas do que as negociações
globais? De fato é mais fácil ter comprometimentos individuais em acordos
bilaterais ou regionais do que em negociações globais, mas isso é uma negação
do processo diplomático da ONU, que é multilateral e precisa ser assinado por
todos. Além disso, são essas negociações globais que impulsionam os países a
estabelecer esses acordos menores.
Há hoje condições financeiras e sociais para que os países
estabeleçam planos que consigam limitar o aquecimento global à meta de dois
graus de elevação até o fim do século, o ideal para evitar cenários de contornos
catastróficos? Esse ponto é um problema. O último relatório do IPCC (Painel
Intergovernamental de Mudanças Climáticas, órgão da ONU) dá estimativas dos
esforços que seriam necessários para atingir tal objetivo, e não estamos
próximos de cumpri-los. Mas não vamos ser pessimistas, porque as coisas estão
progredindo. Uma indústria poderosa de renováveis está sendo construída, e isso
é importante porque no começo não havia nenhum interesse econômico nas
negociações. Como os Estados Unidos estão de olho na indústria renovável, os
seus diplomatas devem aceitar termos com os quais eles não concordariam no
passado.
http://veja.abril.com.br/
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