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BELÍSSIMO EXEMPLO! PHD EM HARVARD COM 101 PRÊMIOS, FALA SOBRE RACISMO E EDUCAÇÃO: 'CONHECI TODAS AS FORMAS DE PRECONCEITO'
12:52Carlos Alberto-Há 40 anos vivendo Brasília!
PHD EM HARVARD COM 101 PRÊMIOS, FALA SOBRE RACISMO E EDUCAÇÃO: 'CONHECI
TODAS AS FORMAS DE PRECONCEITO'
Joana D’Arc Félix esteve em Porto Velho para
palestrar sobre educação científica. — Foto: Mayara Subtil/G1
A voz serena junto ao jeito tímido e sutilmente
cômico de se comunicar não escondem o empoderamento que a professora Joana
D’Arc Félix, de 45 anos, carrega de berço. Ela é mestre, PhD em química pela
Universidade de Harvard, dos Estados Unidos e coleciona 101 prêmios como
cientista.
Para tal conquista, Joana, que se especializou
em estudos sobre resíduos gerados no setor coureiro-calçadista encarou a fome,
o racismo dentro e fora do Brasil e a pobreza.
"Eu passei a acreditar que se eu estudasse, ia vencer na vida. Mas
não foi fácil. Enfrentei tudo de cabeça erguida com apoio da família",
disse.
Pela primeira vez, Joana D’Arc esteve em Porto
Velho essa semana (no período que homenageia a Consciência Negra) para
participar da 6ª edição do Congresso de Pesquisa, Ensino e Extensão (Conpex),
do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Rondônia (Ifro).
O evento se estende até a próxima sexta-feira
(23). O debate central do seu discurso tratou do papel da educação científica
na construção do conhecimento.
Há 10 anos, Joana é professora na Escola
Agrícola de Franca, no interior de São Paulo. O objetivo, hoje, é formar novas
gerações de cientistas.
"São jovens advindos das drogas e da
prostituição e meu foco de trabalho é esse. É propor um mundo melhor por meio
da educação científica", salientou.

"Estuda pra ser alguém na vida''
A caminhada de sucesso pelo mundo da pesquisa
começou em Franca, cidade onde nasceu e cresceu. Porém, por ser pobre e filha
de pai e mãe semianalfabetos, jamais imaginou seguir o caminho acadêmico.
"Minha mãe era empregada doméstica. Meu
pai trabalhava em um curtume. O salário era muito baixo. A gente mal tinha onde
morar", contou.
A caçula de três irmãos viveu em uma casa
dentro de uma indústria química de curtume (local onde é feito o preparo do
couro para depois ser usado) arrumada pelo patrão do pai dela.
"Foi nessa casa onde nasci. Por causa
disso, ninguém nos visitava, pois o curtume fede", explicou.
Por ser a menor dos irmãos, a mãe de Joana
costumava levar a menina para o serviço. Com o objetivo de deixar a criança
"quieta", a cientista conta que a mãe a ensinava algumas palavras
escritas em jornais impressos, mesmo sendo semianalfabeta.
"Minha mãe foi minha primeira professora".
A facilidade no aprendizado surpreendeu a
diretora de uma escola na época. Como consequência, foi matriculada no ensino
fundamental.
“Ela perguntou se eu estava vendo as fotos do
jornal e respondi que não, que estava lendo. Ela se surpreendeu, me pediu para
ler um pedaço e fiz isso. Por coincidência, era início de ano e ela sugeriu que
eu passasse uns dias na escola. Caso eu conseguisse acompanhar a vaga seria
minha e funcionou”.
Precoce, Joana concluiu o ensino médio aos 14
anos. Nesse meio tempo, conheceu o preconceito racial e social de quem nasce
pobre e negro.
"Na terceira série, eu mudei para uma escola estadual, pois era mais
perto de casa. Só que era muito elitizada. Foi aí que conheci todas as formas
de preconceito", disse Joana.
Segundo ela, a mais marcante foi quando garotos
a chutaram por usar um sapato furado que tinha por dentro um saco plástico e
papelão. Entre eles, seu apelido era "neguinha fedida do curtume".
"Eu fui tão excluída que meu pai falava
'estuda pra ser alguém na vida'. Então, eu disse: vou me esforçar ao máximo pra
vencer na vida", contou. "As crianças não nascem racistas. Elas
aprendem com os mais velhos".
Depois que concluiu o ensino médio, começou a
cursar química na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) – Joana também
passou no vestibular para Universidade Estadual Paulista (UNESP) e Universidade
de São Paulo (USP). Se formou aos 17 anos e conseguiu ingressar, logo em
seguida, no mestrado e no doutorado.
Racismo nos EUA
Durante o doutorado, Joana conseguiu ir para os
Estados Unidos com o auxílio e incentivo do orientador. Em um ano, estudou na
Universidade de Clemson, na Carolina do Sul. O estado é um dos mais racistas do
país norte-americano.
"Os brancos daquela região se recusam em 'servir' os negros. Era
como se eu estivesse roubando a vaga de um branco", contou.
Por causa do racismo, ela contava com quatro
amigos europeus para tudo, até mesmo para comprar um lápis. "Sempre
lembrava do meu pai, quando ele dizia que era pra encarar de frente. E fiz
isso".
Após o período, ela retornou ao Brasil e
concluiu o doutorado também na Unicamp. O convite para fazer o pós-doutorado em
Harvard surgiu logo em seguida, aos 25 anos, depois da publicação de um artigo
científico na revista acadêmica Journal of the American Chemical
Society.

Pesquisadora enfrentou a pobreza e chegou à
Universidade Harvard, nos EUA. — Foto: Stella Reis/EPTV
Por conta do trabalho feito no Brasil com
estudantes de Franca, Joana D'Arc acumula 101 prêmios. Entre eles está o de
"Pesquisadora do Ano", no Kurt Politizer de Tecnologia de 2014,
projetos em feiras e de "Personalidade do Ano" pelo Faz Diferença
2017, iniciativa do jornal O Globo, em parceria com a Federação das Indústrias
do Estado do Rio de Janeiro (Firjan).
"Acho que é até importante falar que para
outras pessoas também e ver que é possível. Que independente da condição
financeira é possível chegar lá. Mas, claro, a partir de um esforço",
aconselhou.
G1.
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